Amigos da vagabundagem convicta
meu cordial...boa noite
Na falta do que fazer nessa pandemia resolvi...filosofar....e deu nisso:
Dilema do Corona
Eu vivia...ate certo ponto, bem!
Não me lembro, nos últimos 65 anos de ter me sentido
depressivo. Não que não tivesse ocorrido momentos desagradáveis na minha vida,
muito pelo contrário, sofri dois acidentes automobilísticos graves a ponto de
ter sido desenganado pelos médicos nos dois, mas acabei sobrevivendo com poucos
danos físicos e restrições motoras imperceptíveis. Os danos estéticos não foram
tão grandes a ponto de causarem problemas de relacionamentos sociais, ou
amorosos. Já no campo profissional, as decepções que ocorreram foram
compensadas pelas realizações bem sucedidas e reconhecidas pelos meus pares,
portanto sem efeitos depressivos.
Dessa forma cheguei a 2019 me sentindo realizado e
satisfeito com a minha existência e tranquilo para encarar a fase, oficialmente
batizada de “idoso,” na terceira idade e com alguns privilégios concedidos pelas
autoridades e sociedade politicamente corretos que dominam todas as sociedades
civilizadas atuais. Confesso que me sentia desconfortável com essa situação de “privilegiado
oficial” !...mas não contestei para não ser taxado de contestador revoltado.
Em 2019 quando me preparava para desbravar o mundo a bordo
de um possante conversível (sonho de infância preste a ser realizado), a vida
resolveu fazer surpresas, inicialmente pra mim ...e com o passar do tempo em 2020,
pra toda a humanidade.
As surpresas iniciaram em meados de 2019 quando descobri que
estava sendo engado por uma pessoa querida e muito próxima desde 2007. Meio sem
saber a motivação dessa primeira surpresa, adotei uma postura conciliativa para
benefício do relacionamento familiar.
Quando imaginei que
estava me refazendo dessa surpresa...sofri uma nova surpresa familiar, não que
a morte da minha mãe , aos 91 anos fosse a surpresa, mas a burocracia que se
seguiu por conta do inventario foi uma sequencia de surpresas desagradáveis,
seja pelo viés familiar, seja pelo viés burocrático legal ...ou seja pela
atitude gananciosa de ambos . E foi assim que 2020 debutou.
A temporada de
surpresas 2020 se iniciou em grande estilo quando o mundo foi apresentado a
pandemia do Corona Vírus.
Hoje , em plena vigência da surpresa pandêmica, entre um
panelaço e outro, em meio a discussões e entrevistas de inúmeras e
internacionais autoridades politicas senti os primeiros sintomas....não do
famoso vírus coroado...mas de uma depressão .
As consequências da pandemia me obrigaram a me manter trancado
dentro de casa, porque eu , oficialmente privilegiado idoso, fui reclassificado
como “cidadão em grupo de risco “!Dentro dessa nova classificação passei a ser
uma ameaça para sociedade uma vez que eu , nas minhas condições poderia causar
(e está causando) a falência do sistema de saúde prejudicando além dos
pacientes mais jovens (portanto ainda produtivos) assim como os profissionais
de saúde expostos aos idosos contaminados ( os essenciais)
Quando constatei essa minha nova função na sociedade; idoso,
improdutivo, de grupo de risco, não essencial (portanto descartável ou supérfluo)
...me senti como a causa de todos os problemas da humanidade...e entrei em depressão
profunda!
Como sou ateu, portando sem crenças religiosas, que encara a
morte apenas como uma das fases da vida, e cidadão consciente, além de , agora,
depressivo....resolvi, num ato heroico:...me suicidar !
Tendo, conscientemente, tomado essa radical decisão, parti
para a execução. Me preparei planejando a forma de não causar maiores danos à
sociedade já tão carregada de problemas. Assim descartei os métodos doloridos, nojentos,
demorados e com alta probabilidade de insucesso. Enquanto fazia um Estudo
Estado Maior , conhecido como PPM(Processo de Planejamento Militar) para
encontrar a melhor forma de resolver o problema, acabei concluindo que durante
o teste AEA ( adequabilidade, exequibilidade, aceitabilidade)....nenhuma das LA
(Linhas de Ação) , passou no teste de Adequabilidade, porque não resolveria o
problema !!!
Não resolveria o problema da sociedade porque estando morto
o defunto seria um novo problema para o já saturado sistema funerário.
Diante desse novo dilema...me senti confuso...e resolvi
tomar uma cerveja ...acendi um cigarro na janela.... e ouvi um rapaz gritando da varanda do seu apartamento no prédio
em frente: “FORA ... ASSASSINO....TRAIDOR...”.
Foi aí .... que senti que a depressão havia desaparecido....
e cheguei à conclusão que não era eu ...o responsável por essa situação que
chegou à humanidade politicamente correta.
Voltei para o escritório... escrevi...assinei o Netflix....e vou ver um
filme...depois vou dormir...porque amanhã é um novo dia.... e eu não me surpreendo
mais ....estou preparado pra tudo....até pra nada.